Estive impossibilitado de assistir a melhor partida do torneio até agora. Por isso, o amigo e grande escritor Guilherme Masi fez esta belíssima resenha do jogo.
Por GUILHERME MASI:
22:00 de uma sexta-feira pré carnaval. Pouco mais de 7.000 pessoas acabaram de assistir um belo jogo entre David Nalbandian e Filippo Volandri, com vitória do italiano em três sets.
Ginásio cheio, expectativa em alta para o último jogo da noite: Thomaz Bellucci x Leonardo Mayer. Brasil x Argentina. E tão alta quanto a expectativa era a tensão claramente sentida nas arquibancadas do Ibirapuera. Por quê?
Simplesmente porque apesar de muito talentoso, Bellucci é muito instável e não tem aquele semblante alegre e carismático de Guga que conquistou o país. Sem falar no incômodo retrospecto de não vencer duas partidas seguidas no circuito há sete meses.
Dito isso, o jogo começa com o apoio tímido da torcida e um Bellucci comprovando os nossos medos. Apático e com erros infantis, Thomaz começa muito mal e deixa o argentino, dono de um poderoso saque, quebrar o seu serviço e abrir 0/3. O brasileiro, no restante do set, mostra lampejos de top ten, mas é massacrado pelo hermano em 3/6.
As mais de 7.000 pessoas desanimam. Mas como o serviço do primeiro game do 2º set é de Belluci, que ganha e passa a comandar o placar, a torcida volta a se animar. Diferente da primeira parcial, os tenistas equilibram o jogo até o sexto game. No 3/2, então, a torcida acorda de vez. E aqui cabe um parênteses.
(Amigo, no Brasil, Brasil e Argentina é Brasil e Argentina. Não importa o esporte, é sempre a mesma coisa)
Voltando. Como eu disse, no sexto game a torcida acordou de vez. Mais do que isso, acordou para torcer contra um argentino. E isso nós fazemos melhor do que ninguém. Das arquibancadas do ginásio vinham vaias ensurdecedoras, gritos de "boludo", "cabrón" e o já tradicional "chuuupa!". A pressão funcionou, Bellucci quebrou saque de Mayer, abriu 4/2 e daí para frente entrou em uma sintonia perfeita com a torcida alucinada e fechou o 2º set em 6/2.
O Ibirapuera explodiu. Virou Copa Davis. "Vamo Bellucci!" era alternado com "Vamo Thomaz!" na boca do torcedor que já fazia ola nas arquibancadas. E nessa euforia começa o terceiro set. Começa mal, é verdade. Logo no primeiro game Bellucci tem seu saque quebrado e nós levamos um rápido banho de água fria. Rápido porque, apesar de continuar errando bolas fáceis, Thomaz não abaixa a cabeça e continua lutando, game a game, com a torcida sempre ao seu lado: 0/2, 1/2, 1/3, 2/3, 2/4, 3/4, 3/5, 4/5.
Décimo game. A última chance. Leonardo Mayer saca para o jogo. A torcida pressiona, assobia, vaia e xinga sem parar o argentino. O árbitro até tenta conter a euforia. Em vão. A pressão é tão grande que o público grita a cada erro de primeiro serviço de Mayer. Ele também mostra seu lado catimbeiro, para o jogo, reclama com juiz, verifica a quadra, amarra o cadarço. Nada adianta, também. Ele sente a pressão, faz a dupla falta e um erro não forçado logo em seguida: 15/40. Duplo break point. E com uma torcida ensandecida, de pé, com os punhos cerrados gritando por Bellucci, nosso brasileiro enfia a mão na bola para quebrar o saque e levar, mais uma vez, o Ibirapuera à loucura!
5/5. Depois do empate, apesar do nervosismo e salvando um break point que arrepiou até a alma, Bellucci, ao som de "Eu sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor", faz o seu serviço e quebra de novo o argentino para ganhar o jogo em um virada espetacular.
Êxtase! Esse era o sentimento nos ares do Ibirapuera. Êxtase de uma torcida que finalmente abraçou o tenista da casa. Êxtase de um tenista que finalmente se sentiu em casa. Foi, com certeza, a redenção de Thomaz Bellucci que diante de uma comemoração digna de título, pegou o microfone e mesmo tímido disse: "Nunca senti uma energia tão positiva assim jogando no Brasil".
Nem a gente, Thomaz. Nem a gente.
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